sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Carta que a Musa me escreveu


Faz isto.
Faz aquilo.
Não é nada disto.
É isto mas não chega.

Birrinhas de merda, é o que és. Ando eu aqui a tentar fazer algo pela espécie de coisa a que chamas de vida enquanto tu fazes o check obrigatório aos dias que passam.
Fizeste o teu trabalho? - Check.
Viste o correio? - Check.
Limpaste a cozinha? - Check-mate filho da puta, que até a merda do microondas limpaste canto-a-canto. Que é que tu queres mais? Escrever Os Lusíadas do séc. XXI de trás para a frente em pé numa Moto 4? Vai dar banho ao cão! - Check.

Não me chegam os dedos nem os solavancos na boca para dar carta às tuas exigências. Estás à espera do quê? É quase uma da manhã: vai para a rua mudar o mundo com a tua meia dúzia de rimas e o teu Só-Li-Dó. Mas espera, fica mais um bocadinho! Vais com tanta pressa para a onde? Para a cova? Ou pensas que vais renascer um gajo melhor, qual fénix que se ergue da bosta? Solo se vive una vez, aiaiaiaiaiai.

Ainda vais acabar na calçada com meio-chinelo no pé que te resta, como o sem-abrigo na Avenida que a esta hora declama a sua demente poesia a qualquer grupo de estrangeiros com um doze avos de português e que estejam para o aturar. E tu aqui de papo para o ar a resmungar com a alma que tens, porque nem o mundo inteiro de mão beijada te chegava para enganar a fome, a ganância, a gula ou o que tu lhe quiseres chamar. Mas olha, pega aí no dicionário para ver se encontras um sinónimo mais erudito para gula. Ou queres passar por parvo em frente da meia-dúzia de gatos pingados que tentam dar noção aos teus tristes devaneios que não são mais do que fruto do acaso? Nem a merda da cara és capaz de dar, como um cobarde que se esconde por detrás de um muro de palavras só para ver se a frase seguinte consegue esconder um pouco a verdade da anterior. Pim.

Não vai, nem racha. E achas que entretanto, por o teu coração se acalmar, que o trabalho está feito. Porque deste a esta febre de escrever aquilo que ela cria. (Verifica as vezes que quiseres, a última palavra não é um erro). Porque deste cedência de passagem a esta máscara que não é se não uma compulsão. E ficas satisfeito, porque há quem o tome por uma coisa chamada de Arte

Quando tudo isto é pânico. 
Tudo é ilusão. 
Nada mudou. 
Tudo se destrói.

4 comentários:

Hugo de Oliveira disse...

"Tudo se destrói." Check! ;)

Um abraço.

Depois de muito tempo ausente do blog, é bom saber que ainda continuas a escrever.

T disse...

Hugo, há quanto tempo!

De vez em quando acontece um percalço e caem umas palavras da mão. Bom ver que tu também continuas em força.

Abraço.

Teresa Margarida Costa disse...

UAU! Tu "zangado" és impressionante.
Adorei o ritmo, a intensidade!!! Parabéns :)

T disse...

Tentarei zangar-me mais vezes, então.
Obrigado.

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