quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Adeus, velho

.
3 horas de sono. Puxam-me da inconsciência com a frase O avô morreu. É solavanco que chegue para conseguir levantar-me. Tomo um banho rápido num sonambulismo silencioso, arranjo-me com calma e pego no carro.

A notícia não foi como uma faca a cravar-se no peito. Foi mais um bisturi que me dissecou lentamente o dia todo.

A minha irmã e a minha mãe estavam no quarto dele.
O quarto estava morto, também.

Morreu durante o sono, disseram-me. Não deu por nada. Escolhi acreditar que sim, apesar dos olhos cristalizados no tecto. A boca entreaberta num suspiro congelado.

Depois as burocracias. O que fazer com o corpo, os pestilentos pêsames de quem respeita os mortos. Não aguento a conversa, volto para o seu quarto, agora sozinho, para me despedir.

As últimas palavras que ele me disse. A visita que adiei, agora tarde demais. Os bombons de chocolate que me presenteava em criança.
É das raras ocasiões em que choro.

Lavo a cara na sua casa-de-banho. A dentadura dele lá jazia ao lado da escova de dentes. É preciso arranjar coragem para voltar para baixo, há muito a fazer. A minha avó ainda não sabe de nada. Merda. Merda para todos vocês. Merda por me obrigarem a tomar decisões.

Fumei muito, hoje? Não sei. Não sei quantas pequenas batalhas travei hoje. O cheiro a Morte agarra-se à roupa e à alma e não há forma de lavar.

Amanhã o funeral. Adeus, velho.

4 comentários:

Sesguidores